Os afazeres nas manhãs de sábado, naquela
família, eram rotineiros, quase tradicionais. Era o dia da faxina.
Cabia à mãe coordenar as atividades,
distribuindo às filhas os deveres domésticos, enquanto aos filhos cabiam os
deveres do mundo.
Injusta ou não, essa era a estrutura familiar
vigente.
Certa manhã, após grande esforço físico e
tempo dedicado, Cecília terminava de encerar e fazer brilhar o assoalho da
sala.
Sem os recursos da tecnologia, fazer com que
as tábuas de madeira, gastas com o tempo, reluzissem tal qual a mãe queria, não
era tarefa fácil.
Quase a concluir o serviço, surgiu à porta
seu irmão gêmeo, Jeremias.
Ao vê-lo adentrar a sala, imediatamente
Cecília o proibiu de dar um passo a mais. Afirmava que ele deveria dar a volta,
pelos fundos da casa e entrar pela cozinha. Nem pensar em atravessar a sala,
perfeitamente brilhante, como desejava a mãe.
Ele insistiu e deu
uns passos para dentro. Ela, cansada, ficou com muita raiva e gritou: Se
pisar nesta sala, que estou acabando de encerar, nunca mais falo com você!!
O irmão achou divertido o desafio. Riu e
andou, a passos firmes, sala adentro.
Furiosa com as pegadas empoeiradas do irmão,
que ficou do outro lado, a afrontá-la, tomando tudo como uma grande
brincadeira, Cecília cumpriu sua promessa.
Nos primeiros dias, todos os familiares
acreditavam que se tratava de uma birra.
Porém, as semanas foram passando céleres, e o
silêncio entre os dois não se modificou.
Ela não cedia, pois havia feito claramente
uma promessa. Ele não se aproximava, pois via naquilo tudo uma infantilidade da
irmã.
Os anos foram se somando. O silêncio passou a
ser hábito entre os dois.
Eles se enamoraram cada qual se casou e
deixou a casa dos pais, constituindo suas próprias famílias.
Os anos não modificaram a disposição de
nenhum deles. Ninguém cedeu, tentou reaproximação, diluir algo que acontecera,
num dia que já se fazia distante.
Vinte e cinco anos se passaram desde aquela
tolice de uma manhã de sábado.
O telefone tocou e a notícia atingiu o
coração de Jeremias como um gélido punhal.
Rapidamente foi ao encontro da irmã no
hospital, vitimada por um acidente vascular cerebral.
Ao vê-la imóvel no leito, deu-se conta dos
anos corridos, da grande tolice que ambos se permitiram.
Por orgulho, mantiveram silêncio por tantos
anos, afastaram-se um do outro, deixaram de conviver, de estreitar ainda mais
os laços do afeto.
Tudo por não querer ceder, não dar o primeiro
passo, fazer o primeiro gesto, no sentido da reconciliação, de um simples
pedido de desculpas.
Por quê? - Perguntava-se ele,
aturdido, ante a irmã imóvel, no leito do hospital.
Qual o preço de tão absurdo orgulho? Abrira
mão da convivência, do compartilhar a vida com ela, por orgulho.
Afinal, ele sempre esperara que ela, que
fizera a promessa, tomasse a iniciativa da reconciliação e voltassem a se
falar, a conviver.
Agora, ante a dura lição, ele pôde aquilatar
o preço que pagara pelo seu orgulho.
Logo mais descobriria que a irmã não
retornaria à consciência.
*
* *
Tolo orgulho o que carregamos no coração.
Repensemos nossas atitudes e, se descobrirmos que alguém aguarda nossas
desculpas, caminhemos em sua direção, de imediato, sem aguardar o amanhã.
Sejamos nós a dar o primeiro passo, a
estender a mão, a sorrir, a viver bem.
Redação do Momento Espírita.
Em 27.8.2014.
Em 27.8.2014.
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